Assim vai Portugal muito bom texto sem duvida... Os meus parabens ao Sr. António Marques

Há Mar e Mar

Um dia destes fui em família a um supermercado da minha cidade do coração, pacata, bonita, com gente por dentro.
Fui comprar umas coisitas e o que vi, li, comparei e apreciei deu-me uma vontade fantástica de chorar, de carpir mágoas de me revoltar contra os Homens e contra Deus e por fim surpreendido dei comigo a rir como um maluco que devo ser.
Ora vejamos:
Aterrei na secção de frescos do super, hiper, macro, extra mercado do meu burgo, com mulher e a filha, derrepente, ao piscar o olho ao marisco e ao peixe, por esta ordem, que sonhar em tempo de crise, ainda é possível, disse em voz alta para espanto de todos, “Estou outra vez nos jogos sem fronteiras, estou mais novo trinta anos, pelo menos vou fazer uma peixeirada.
Ali, a gozar comigo, riam-se peixes, mariscos e derivados dos 4 cantos deste mundo, com cara de gôzo, como a sugerirem que sou analfabeto.
O camarão vinha do Equador, o burrié acabava de chegar da Irlanda, a perca era do Egipto, a sapateira aterrava de Madagáscar, o polvo malandreco saltava de Marrocos, o berbigão navegara das Ilhas Fidji, e a abrótea para minha grande inveja chegara do Haiti.
Fiquei siderado de vergonha.
Então estes patifes destes peixes e destes mariscos viajam mais do eu?
Como poderei comer uma abrótea Haitiana sem chorar?
Como arrisco abrir um berbigão das maravilhosas Fidji sem suspirar?
Ali, mesmo ao lado destas espécies gastronómicas dei em doido e comecei a interrogar as variedades, conversando com elas, se lá donde vinham o mar é como o nosso, se as ondas são como as da Foz do Arelho, se têm família, coisas simples só para meter paleio e não deixar a péssima impressão de que só porque procuro três ou quatro carapaus dos baratos, não sou viajado, não conheço este mundo e o outro.
Que diabo, sinto-me incomodado ao dar comigo a desconfiar de uma gamba ou a tirar demasias com um linguado Cubano quando nem a Badajoz consigo ir comprar caramelos.
Há coisas que não se fazem a um cristão e esta de me atirarem á cara que o tamboril Escocês percorre mais milhas para aqui chegar do que eu viajo em cada ano, faz doer a alma.
Que raio, se o peixe-espada veio do Quénia, aquilo sim é animal de carreira, imaginem o tempo que gozou a passear.
Agora a perca meus amigos, veio do Egipto, andou pelo Nilo, viu as Pirâmides, e eu, sumido e raquítico imagino-me no museu do Cairo e fico vermelho de raiva, valha-me o gelo para me arrefecer.
Mas sinceramente, o que mais me apoucou foi o polvo Marroquino. 
Chamei a vendedora e a medo, tremelicando, pedi em voz muito baixa, “Dê-me quinhentos de polvo” e tive que perscrutar em torno se havia bófia no horizonte. Que vergonhaça. Não me fiz ouvir, porque em resposta indagou?
O Sr. está com problemas de saúde?
Ora bolas minha senhora deixe lá o Polvo, estava a brincar, avie-me mas é um robalo de Chernobyl, é para o almoço, sabe não há nada mais apetitoso que uns lombinhos de robalo de Chernobyl.
Olhe, viesse mais cedo, porque estavam em conta e já se acabaram.
Que diabo, gritei então, não tenho sorte nenhuma.
Sai do estabelecimento barafustando á minha maneira e ralhei, ralhei a esmo.
Ao menos podíamo-nos virar para o nosso Mar
Se ao menos tivéssemos Mar.
Mas nós temos, dizia-me a garota para me sossegar, mas nós temos, repetia a mãe apaziguadora como sempre, passa ali na Foz do Arelho.
E Eu acreditei, já acredito em tudo e lembrei-me de Pessoa:
Há Mar e Mar…

António Marques

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